Vivemos um tempo de intensa transformação no Poder Judiciário brasileiro. Com o avanço da tecnologia, especialmente após os desafios impostos pela pandemia, consolidou-se a necessidade de um Judiciário mais eficiente, acessível e transparente. É nesse cenário que nasce o Programa Justiça 4.0, uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), voltada à modernização digital do sistema de Justiça no Brasil.
O Justiça 4.0 não se limita a informatizar processos. Ele propõe uma verdadeira reestruturação da forma como se faz justiça, integrando inteligência artificial, big data, plataformas digitais interoperáveis, atendimento remoto e automação de rotinas. Trata-se de um modelo que valoriza a inovação, a eficiência e a acessibilidade, e que visa não apenas acelerar decisões, mas também garantir que sejam mais seguras, consistentes e centradas no cidadão.
Entre os marcos do programa estão o Domicílio Judicial Eletrônico, o Juízo 100% Digital, os Núcleos de Justiça 4.0, o Banco Nacional de Precedentes, o uso de IA para triagem e classificação de processos, e o portal Jus.br — que centraliza serviços digitais de mais de 90 tribunais em um único ambiente. Trata-se de um ecossistema que redefine o funcionamento da Justiça brasileira.
Mas, diante dessa revolução silenciosa, como fica a advocacia?
A primeira constatação é inevitável: o papel da advocacia também está em transformação. As habilidades técnicas tradicionais — domínio do direito material e processual, capacidade argumentativa e oratória — permanecem essenciais. Mas a advocacia do presente (e do futuro próximo) exige também fluência digital, capacidade de interpretar dados e decisões automatizadas, além de familiaridade com plataformas e sistemas que, até pouco tempo, eram restritos a áreas internas dos tribunais.
Não basta conhecer a lei; é preciso saber como ela será lida por um sistema algorítmico.
É nesse ponto que surge a responsabilidade institucional da advocacia: acompanhar, participar e influenciar esse processo. Os advogados devem ocupar espaços nos debates sobre o uso ético da inteligência artificial, sobre a transparência dos códigos que classificam petições, sobre a preservação das garantias fundamentais em ambientes automatizados. Devem, igualmente, cobrar a interoperabilidade entre sistemas, a equidade no acesso digital e o fortalecimento da atuação advocatícia mesmo nos núcleos 100% digitais.
O futuro da justiça será cada vez mais tecnológico. E a advocacia não pode ser mera espectadora dessa transformação. Ela deve ser protagonista, zelando para que a inovação venha acompanhada de garantias processuais, respeito ao contraditório e efetividade no acesso aos direitos.
O desafio está lançado: mais do que acompanhar a transformação, é tempo de conduzi-la.